quarta-feira, 10 de novembro de 2010

#Leucemia : Quando ela bate na sua porta!

Cantando espalharei por toda parte,

Se a tanto me ajudar o engenho e arte.



(Lusíadas - Camões)

Preciso esclarecer alguns pontos antes de escrever sobre Leucemia:

1)    Este artigo não tem caráter científico, para que se interessar em conhecer mais profundamente a leucemia pesquisar no Site do INCA (http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/leucemia )

2)    Tem caráter pessoal de depoimento, de alerta e ajuda para aqueles que de repente se viram nesta situação de enfrentar uma doença grave e não saber o que fazer, ou a quem apelar;

3)    Tem também a necessidade de difundir a urgência em se ter doadores de medula, de sangue e/ou plaquetas, pois assim ajuda a salvar vidas;

É muito doloroso contar o que tenho vivido nestes últimos 5 meses, mas meu depoimento talvez ajude a esclarecer alguns mitos e também me ajuda a enfrentar esta situação.

Sintomas da Leucemia

Por volta da metade de maio estava em viagem a Belém, depois Recife, quando minha filha mais velha, com 12 anos e 6 meses, sentiu muitas dores nas costas de muita intensidade. Levada ao hospital num plantão noturno foi diagnosticada que seria uma dor lombar que com Tandrilax(analgésico) aliviaria as dores e depois um exame com ortopedistas ajudaria a desvendar a origem delas.

Semana seguinte, numa outra madrugada, novas dores, só que agora se localizava na região dos quadris e nas pernas, uma noite inteira acordados fazendo massagens  e ministramos Novalgina e Tandrilax, pois no dia seguinte teria a consulta com ortopedista.

Exame corporal nada constatou que houvesse problema de coluna ou nos quadris. Pedido exame de tomografia da região lombar e ultrassonografia das vias urinarias para ver se havia problema nos rins.

Feitos os exames, próximo ao retorno médico teve mais duas noites de muitas dores: costas, quadris, pernas e no estômago. Dia 11 de junho, muito abatida, levamos ao Hospital Santa Catarina por acharmos que talvez fosse anemia, pois estava muito pálida. Para nossa imensa sorte um médico muito jovem, provavelmente um residente, que fazia plantão, ao ouvir relato do caso, imediatamente pediu um Hemograma completo.

Três horas depois nosso mundo desabou: suspeita fortíssima de que ela estava com Leucemia. Resultado do exame apontou que leucócitos abaixo de 1000(normal entre de 4700 e 9100), Hemoglobina 7(normal entre 10 e 12) e plaquetas 9000(normal entre 150mil e 400 mil).O jovem médico foi bem claro que seria leucemia, precisava apenas confirmar o tipo.

Leucemia, e agora?

Ficamos absolutamente passados, nossa visão de Leucemia é ligada à morte, de câncer devastador, que deveríamos fazer? Uma sexta a noite, com quem contar medo de falar para pessoas e minha filha passar a ser estigmatizada. O que falar para ela, como segurar o choro diante dela? Toda nossa vida é repassada em poucos segundos, sem ter tempo de pensar racionalmente em nada.

No sábado uma Oncologista Infantil do Itaci (http://www.itaci-fc.org.br/conheca-nos.htm ) que também atende no Hospital Santa Catarina veio nos visitar e dar as primeiras ordens:

1)    Fazer mielograma e fenotipagem, exames que determinam se é leucemia e qual tipo de leucemia;

2)    Falou abertamente com minha filha do que se tratava e quais as conseqüências do tratamento, dependendo do tipo;

Claro que você tem que ter estresse com convênio para aprovação de exames, que são caríssimos e bem específicos, além de começar a se preparar para uma nova vida, com TODOS os desdobramentos.



Leucemia e quimioterapia



Imediatamente constatada a possível doença a internação foi exigida, rotina de dormir e acordar em hospital, família dividida entre casa, algum trabalho, levar e trazer roupas.

Começa a parte mais dolorosa fazer os exames indicados e esperar seus resultados, a leucemia tem basicamente 4 tipos:

1)    LLA – Linfóide Aguda

2)    LLC – Linfóide Crônica

3)    LMA – Mielóide Aguda

4)    LMC – Mielóide Crônica

Minha filha esta com a LLA cujo tratamento é feito com PoliQuimioterapia, que tem um procedimento de 120 Semanas de tratamento feito à base de Quimioterapia. Dividido em várias fases. Tal procedimento é conhecido como Protocolo Brasileiro com grande eficácia.

A primeira fase do tratamento é extremamente agressiva, com doses de quimioterapia a cada dois dias por 2 ou 3 semanas. A necessidade de “zerar” a medula, para que ela possa voltar a produzir sangue e plaquetas de melhor qualidade, além de controle para que as células cancerígenas não passem da medula ao Sistema Nervoso central.

Devido à intensidade do tratamento combinado com a extrema debilidade do paciente é comum bactérias e os perigosos fungos atacarem. Para nossa infelicidade no decorrer da 3ª semana começaram aparecer bactérias e febres constantes. Depois o pior dos casos um fungo muito resistente se instalou no pulmão, tornando o caso mais grave do que já era.

Por quase 3 semanas teve que ficar na UTI e passou a experimentar pesados e caros antifúngicos, num paciente normal com um mês qualquer colônia de fungos seriam debeladas. Ela tomou por mais de mês na veia e terá que tomar por via oral por mais 6 meses um antifúngico chamado Voriconazol (VFEND – Pfizer) que custa R$ 4500,00 por semana. Por ser medicamento oral o convênio não cobre (vejam a contradição se ela estivesse no hospital recebendo medicamento intravenoso, eles pagariam, custo intravenoso é o dobro, fora despesa de internação).

Tratamento muito Longo e mudanças no corpo e na alma

Em geral na fase inicial do tratamento há queda dos cabelos e o corpo incha devido ao uso de corticóides pesados e a retenção de líquidos, claro que isto para uma jovem linda de 13 anos é muito doloroso, abala confiança, fé, esperança. Tem que ser muito forte para aceitar toda estas mutações do corpo, pelo tratamento agressivo.

Os corticóides também dão crise de abstinência com uma vontade imensa de comer, quase insaciável, além de deixar muito sensível com nervos à flor da pele, mudança extrema de humor. Da alegria ao choro em questão de minutos. Dependendo do tipo do corticóide (são muitos que tem que tomar) os efeitos colaterais são ânsia de vômito e mal estar.

Talvez o que mais nos abala neste tratamento é o longo tempo para que se tenha a alta médica e claro, a possibilidade de acontecer uma recidiva da doença. Toda semana minha filha volta ao hospital para tomar doses de quimioterapia e fazer exames de sangue, Líquor ou mielograma.

Outro fator que engessa a vida é não puder se programa para mais de uma ou duas semanas, na semana que ela comemorou 13 anos ficamos na expectativa de que os exames fossem positivos para que ela pudesse curtir sua festa.

Solidariedade e Esperança



A rede de solidariedade que se abre com pessoas de quem você nunca ouviu falar que passa a rezar, orar, pedir por nós é uma coisa emocionante, os novos amigos que você encontra, os velhos amigos que voltam a conviver neste momento é algo espetacular. Mais de uma centena de colegas da empresa e amigos foram ao banco de sangue doar sangue e/ou plaquetas.

Claro que passamos a ter uma vida totalmente diferente, minha vida está bem dividida antes e depois do dia 11/06/2010. No entanto, todas estas mensagens de apoio nos motivam e fazem com que vivamos um dia após o outro.

Encontrei nas redes sociais (Twitter, Facebook) um ambiente de camaradagem, receptivo e esperança para que nossa luta seja vencida. São palavras de fé, carinho, amizade, não deixando que fique nenhum momento triste ou abatido.

Outro fator grandioso é a menina-mulher guerreira que minha filha se transformou, enfrenta de forma estóica, firme, sofre, mas não esmorece as centenas de picadas de agulhas no hospital, em 150 dias, até hoje, mas de 150 exames de sangue, ou as picadas de injeções que queimam e ardem, mas ela está sempre ali presente, suportando nos ensinando a sermos fortes, de que nós vamos vencer. Morro de orgulho chego a chorar de emoção, com esta Princesa, razão de nossa vida.

É uma rotina muito dura, que não se pode desanimar nem um segundo. A doença não tem causa raiz, ela simplesmente aparece de repente, NUNCA estamos preparados para um mal tão forte, mas vida, os amigos, principalmente minha Grande filha me ensina a enfrentá-la. Situação que não pudemos culpar ninguém, terceirizar o sofrimento, apenas viver de coração e esperança.

Por fim, apelo aos amigos e a todos que lerem o relato se compadecerem das milhares de pessoas que estão em busca de um doador de medula compatível, segue os links com explicação sobre doação. Pense que você pode salvar vidas com seu gesto.